
MATADENTRO
Apesar dos conflitos, o Bosque dos Jequitibás, desconsiderando as áreas culturais, de recreação e o próprio zoológico, também é diariamente visitado por pessoas afim de fazer uso de suas trilhas e pistas para caminhada e corrida. Conhecido pelo remanescente florestal e sendo uma das áreas verdes mais importantes da cidade, apresentando também resquício da Mata Atlântica e sendo visitado anualmente por mais de 1 milhão de pessoas, o Bosque dos Jequitibás torna-se incontestável patrimônio cultural, apesar de problemas em sua administração.




BOSQUE DOS
JEQUITIBÁS
Texto/fotos por Gabriel Amaro
HISTÓRICO
Sua história é iniciada no século XX, quando ainda pertencia a Francisco Bueno de Miranda. Francisco, popularmente conhecido como Bueninho na região, foi um abastado fazendeiro e capitalista. Além do Bosque que, na época, denominava-se como Campo das Caneleiras, também era dono de uma fazenda em Amparo. Caracterizou-se, segundo documentos do Pró-Memória de Campinas, como um "cidadão de espírito nobre".
A partir de 1880, Francisco decide abrir o Bosque para o público, tornando a área um ponto de recreação da população campineira, com arquitetura de Ramos de Azevedo visionando um jardim inglês—feito anteriormente no Centro de Convivência (na época chamado Jardim Público de Campinas . A entrada, no entanto, era concedida mediante a ingresso (na época custando 500 réis por pessoa). Para estimular a visitação, Francisco construiu trilhos que ligavam a região central de Campinas ao Bosque.
Sua iniciativa, contudo, não foi bem sucedida, já que a Companhia Carril desativou a linha por considerá-la deficitária. Com as dificuldades em popularização, ocorreu a venda para a Prefeitura de Campinas, 35 anos depois. Com projetos paisagísticos e urbanísticos implementados pelas décadas seguintes, buscou-se aprimorar o espaço para o conceito de bosque atualmente conhecido. Ele seguiu os passos do desenvolvimento atrelado à Campinas no século XX e desenvolveu-se através de tais projetos.
Na descida da Avenida Aquidaban, em sinalização gráfica horizontal, já deixam o alerta: "DEVAGAR ÁREA DE LAZER". A avenida, de extensão curta em relação as outras da cidade, acaba justamente nos portões do Bosque dos Jequitibás. Com 10 hectares, o local ganha visível destaque em meio a selva de concreto campineira—principalmente quando visto através de mapas ou com auxílio de visão aérea. Consolidado como uma das maiores e mais antigas áreas de lazer de Campinas, o Bosque completou seu centenário nas mãos do poder público há dois anos atrás.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores
- Trecho da poesia Canção do Exílio de Gonçalves Dias, presente na placa de entrada do Bosque
JEQUITIBÁ
[bot.] Jequitibá, que em tupi significa ¨o gigante da floresta¨, é o nome popular e genérico de árvores da Ordem Ericales, família das Lecythidáceas. São árvores de grande porte, com até 50 metros de altura e troncos com diâmetro superiores a 5 metros. São nativas da mata Atlântica e ocorrem apenas na região sudeste do Brasil. O termo ¨jequitibᨠé muitas vezes usado para designar outras árvores de grande porte, causando bastante confusão. São espécies ameaçadas de extinção por perda do habitat natural. Em Santa Rita do Passa Quatro, no estado de São Paulo, existe um exemplar com mais de 50 metros de altura e tronco com 12 metros de diâmetro e com uma idade calculada em cerca de 3 mil anos. O jequitibá é considerada a árvore símbolo do estado de São Paulo. (O Bosque dos Jequitibás tem seu nome baseado em árvores que existem em sua mata, as quais podem chegar a mais de 3.000 anos e mais de 40 metros de altura).
O BOSQUE
Ao descermos a Avenida Aquidaban, nos deparamos, todas as quarta-feiras, com a Feira Orgânica do Bosque. Utilizando o espaço do estacionamento, das sete da manhã até o meio dia, a feira independente ganha vida. Na ativa desde 2006—portanto, completando 11 anos—a feira se torna também um dos pontos de atração do público. Logo ao lado, adentrando aos portões de entrada do parque (que carregam os anos de 1888 e 1978 como detalhe em cada um de seus lados) o visitante é encoberto em caminhos múltiplos para diferentes pontos do bosque. Um deles, o mais conhecido, faz ligação direta com a área de recreação, com várias lanchonetes, uma fonte, um playground para as crianças, além das atrações resultantes do próprio parque, como o Museu de História Natural e o Aquário de Campinas.
Apesar de um espaço muito visitado pelo público, o parque também tem seus problemas de gestão. Como noticiado pelo Carta Campinas, um investimento de quase 2 milhões na revitalização do Bosque acabou deixando de lado o aquário, que apresenta—até hoje—aparência de abandono. O museu também não fica de fora de problemas envolvendo o serviço público. Segundo matéria do ACidade On, quiosques que fazem parte da área de recreação foram furtados, e parte do museu foi fechada. A falta de segurança teve aumento depois da demissão dos guardas privados que eram responsáveis pela parte patrimonial do Bosque.
Seguindo novamente o caminho principal do bosque, quem passa por lá é direcionado primeiramente a Sala de Educação Ambiental Professora Egle Carneiro de Oliveira Passadore, aberta em fevereiro de 2016, com objetivo de ser anfitriã de exposições diversas, além de palestras, encontros e atividades relacionadas a Semana do Meio Ambiente.
Logo ao lado da Sala de Educação Ambiental, encontramos o Teatro Infantil Carlos Maia, projetado especialmente para atender as crianças. Com capacidade para 160 pessoas, o palco tem estilo italiano e fica aberto todos os sábados e domingos. A peça "Natal, uma história de amor!" tem sessões para esse final de semana (9 e 10 de dezembro).
"Dom Pedro II e a Princesa Isabel já visitaram o nosso Bosque"
Segundo relatos, em sua passagem pela cidade, Dom Pedro II e a Princesa Isabel vieram visitar o Bosque. Conta-se que com intuito de agradar a princesa, alguém escreveu seu nome com canivete em um tronco. Quando ela viu, não só não gostou, como ficou muito brava e chateada por se ter machucado a árvore.
- Trecho da placa "VOCÊ SABIA?" presente no início da pista principal
Se do lado esquerdo encontramos esses dois campos culturais do Bosque dos Jequitibás, entrando no pequeno corredor à direita ou seguindo reto, nos deparamos com uma das atrações que mais chama a atenção do público—o zoológico, com 300 espécimes de aves, répteis e mamíferos (incluindo leões, tigres, lobo-guará, macacos-prego, arara-azul, suricatas, hipopótamo, onça pintada, entre outros). Apesar do grande número de visitas, o espaço não escapa de alguns conflitos envolvendo grupos contrários a sua existência.








ZOOLÓGICO E CONFLITOS
Em 2014, um grupo de aproximadamente 30 pessoas protestou por melhores condições aos animais do Bosque, em frente à entrada do parque. A manifestação, noticiada pelo G1, pedia a transferência dos felinos para um outro lugar com espaço mais adequado—a explicação veio da supervisora de recursos humanos Luciana Tibiriçá, entrevistada para a matéria, que foi a organizadora do evento pelo Facebook.
Procurada para relembrar o acontecido, Luciana, atualmente fotógrafa, diz que a situação dos animais não mudou nada, visto que continua existindo constante visitas ao zoológico. "Cresci em uma família de protetores de animais e da natureza, sempre me ensinaram que aprisionar animais é errado. Um dia tomei conhecimento da condição precária dos animais do Bosque, fui até o local e fiquei deprimida ao constatar a condição em que eles vivem", conta.
Mas a discussão envolvendo zoológicos ultrapassa os limites do parque, visto que esse conflito é um problema mundial. Sempre é trazida a tona a diferença entre um santuário e um zoológico, focando positivamente para o santuário e repreendendo os aspectos padrões de um zoológico. Luciana esclarece que a melhor opção seria a criação de um santuário para acolher os animais que não podem ser reinseridos na natureza. "O zoológico tem objetivo de expor animais para entretenimento humano—isso é cruel. O santuário tem objetivo de proteger os animais da forma mais natural possível". Sobre o bosque, Luciana diz que não visita pois, para ela, "é uma prisão, é um local deprimente".
Luciana não está sozinha no debate em relação as condições dos animais do parque. Um abaixo-assinado, feito em agosto de 2016, pedia a retirada dos felinos do bosque, por conta de maus tratos. Segundo o próprio documento, o local seria inapropriado para espécies de grande porte (como os leões que vivem no local). "Nosso intuito é fazer com que a prefeitura transfira os animais. Precisamos unir forças. As pessoas são sensíveis a essa causa, mas muitas vezes não sabem como ajudar", disse a idealizadora do abaixo-assinado, Marcela Doni, em entrevista para o G1.

O Bosque dos Jequitibás recebeu do CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arquitetônico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo) em 1970, o tombamento de seu zoológico; do CONDEPACC (Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural de Campinas) em 1993, o tombamento de todo o conjunto e do IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) em 1995, o reconhecimento de seu zoológico
Como contraponto, existem pessoas que defendem o zoológico como local educativo, que permite um contato singular e uma aproximação das pessoas com os animais, promovendo assim uma conscientização sobre a proteção dos mesmos. Meg Zecchin, estudante de Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Campinas, é uma dessas pessoas. "Considero o Bosque um lugar muito interessante devido à disponibilidade de atividades de lazer e contato com a natureza que ele nos proporciona. Quanto ao zoológico, considero que pelo âmbito cultural ele é um meio das pessoas conhecerem diferentes tipos de animais e também de se mobilizarem sobre a importância da preservação da natureza".
Atualmente, Meg é estagiária de Biologia no Zoológico de Campinas. Diz que, depois que começou e estagiar no Bosque e ter uma visão "por trás dos bastidores", pode perceber o quanto os animais são bem cuidados. "O veterinário do zoológico, Douglas Presotto, é um ótimo profissional e está sempre ensinando novas coisas aos estagiários. Vejo sua preocupação com todos os animais do zoológico. A Técnica de Veterinária trata os animais do setor extra (os que chegam através da Polícia Ambiental) como se fossem seus filhos, dá nome a cada um deles. Além disso, pude perceber o quanto os tratadores possuem um carinho enorme pelos animais".
Sobre os recintos—um dos fatores causadores de discussão entre ativistas—ela conta que, apesar de achar melhor se alguns deles fossem maiores, todos obedecem as normas estabelecidas pelo IBAMA. "Estamos com um projeto de Educação Ambiental para início do ano que vem, o que será de grande benefício para a população e para os animais. Além do projeto de Educação Ambiental, já temos um projeto de Enriquecimento Ambiental para os animais e estamos trabalhando para deixá-lo ainda melhor. Os estagiários foram divididos de acordo com a classe dos animais existentes e ficamos responsáveis por melhorar o Enriquecimento Ambiental (técnica que consiste em deixar o recinto o mais próximo possível com as condições que o animal vive na natureza, a fim de estimula-lo e diminuir seu estresse) de cada recinto", afirma.
Meg faz questão de esclarecer que nenhum dos animais presentes no zoológico foram retirados da natureza para exposição. "Ou já nasceram em cativeiro ou possuem alguma sequela que já não lhe permite ser solto na natureza, pois não sobreviverá". Os animais que conseguem reabilitar, ela ressalta, são devidamente devolvidos à natureza.
SERVIÇO
Parque Bosque dos Jequitibás
Endereço: Rua Coronel Quirino, 02 - Bosque, Campinas - SP, 13025-004
Funcionamento: De terça a domingo, das 7h às 18h
Entrada: Gratuita
Telefone: (19) 3231-8795
Ônibus: 118 (Terminal Ouro Verde/Cambuí), 125 (Terminal Ouro Verde/Shopping Iguatemi), 364 (Jardim São Fernando/Circular Centro), 385 (Shopping Iguatemi/Terminal Metropolitano), 389 (Estação Sousas/Rua José Paulino via Imperial Parque e Jd. Conceição-SEMI-EXPRESSA, INCLUSIVO), 395 (Estação Expendicionários/Notre Dame via Parque da Hípica, Jardim Santa Marcelina e Jardim Guarani), 397 (Gramado/Rodoviária), 502 (Terminal Metropolitano/Av. Júlio de Mesquita-INCLUSIVO)